Direitos e Deveres

Teletrabalho: Que despesas a sua empresa tem de pagar?

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Teletrabalho: Que despesas a sua empresa tem de pagar

Tornado obrigatório para concelhos considerados de risco, mas recomendado também para todo o país, o teletrabalho voltou a crescer em novembro devido à segunda vaga de Covid-19. O regresso do estado de emergência levou também o Governo a clarificar, através do Decreto-Lei n.º 94-A/2020, alguns aspetos polémicos – não todos – das regras do teletrabalho, permitindo aos trabalhadores conhecerem melhor os direitos que têm garantidos quando trabalham a partir de casa. Se está nesta situação há vários meses ou só recentemente teve de entrar em regime de teletrabalho, veja o que pode pedir à sua empresa, o que esta lhe pode exigir e como o Estado vai estar atento ao cumprimento das medidas.

Subsídio de alimentação garantido

Ficou claro que todos os trabalhadores, em casa ou no escritório, têm os mesmos “direitos e deveres”, sem alterações na retribuição, “nomeadamente no que se refere a limites do período normal de trabalho e outras condições de trabalho, segurança e saúde no trabalho e reparação de danos emergentes de acidente de trabalho ou doença profissional, mantendo ainda o direito a receber o subsídio de refeição que já lhe fosse devido”. No caso do seguro de acidentes de trabalho, está perfeitamente enquadrado nos direitos do trabalhador que está fora do escritório habitual, mas aqui entra um fator que deve ser tomado em conta. É que o teletrabalho implica a indicação de uma morada para o exercer, normalmente a habitação, pelo que tudo o que ocorra fora dessa morada não está abrangido pelo seguro, com exceção para deslocações à empresa ou a outros locais para tarefas profissionais específicas (bancos, correios).

Ou seja, levar o computador para uma esplanada ou jardim não é o mesmo que ficar à secretária no escritório, ou na morada de teletrabalho.

Uma cadeira ou secretária para casa? Perguntar não ofende

Quando se fala em teletrabalho, o computador é o primeiro objeto a vir à cabeça. É provavelmente a peça mais importante para trabalhar fora da empresa e deve ser assegurado pela mesma, mas não só. Em relação a outros acessórios, o decreto-lei do Governo indica os “equipamentos de trabalho e comunicação” como sendo responsabilidade da empresa. Ainda assim melhor do que o Código do Trabalho de 2009, que refere apenas instrumentos “respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação”. Nos casos em que o trabalhador já tem todas as ferramentas e até prefere usar as suas, então cabe à empresa “a devida programação e adaptação às necessidades inerentes à prestação de teletrabalho”. No entanto, uma secretária, uma cadeira confortável que garanta uma postura correta durante várias horas, ou uma impressora podem ser fundamentais para o trabalhador. Alguns advogados, em declarações ao Público, entendem que, caso o trabalhador não os tenha ou sinta que não são adequados, deve pedir esses equipamentos ao empregador, limitando o seu uso depois à atividade profissional. A lei não é clara e Telmo Semião, partner da CRS Advogados, refere que uma obrigação deste tipo poderia colocar muitas empresas, já a lidar com as consequências da pandemia, em maiores dificuldades e forçar uma logística desproporcionada.

O advogado lembra ainda que o funcionário “pode recusar o teletrabalho, caso não disponha de condições para exercer as funções neste regime, nomeadamente condições técnicas ou habitacionais adequadas”.

José trabalha na ANA, que acordou condições específicas para os trabalhadores ficarem ou não em teletrabalho. Principalmente nesta segunda fase do outono, segundo nos contou, a gestora de aeroportos “permitiu aos trabalhadores que levassem para casa a cadeira ou algum equipamento que considerassem essencial, devendo apenas fornecer o número do artigo, que já estava catalogado”. Já para Beatriz, que trabalha na farmacêutica animal Zoetis, o teletrabalho sempre foi uma realidade para muitos funcionários da empresa. Com a pandemia, ficaram ainda mais distantes as idas ao escritório, e a Zoetis “reforçou a disponibilidade para fornecer ou pagar consumíveis como tinteiros ou papel caso necessitassem”.

Bom senso e equilíbrio nas despesas

Além dos equipamentos necessários, a nova realidade do teletrabalho trouxe por vezes outras surpresas menos agradáveis às famílias: mais despesa com a casa. Os consumos de eletricidade, água, gás ou telecomunicações aumentam bastante com a permanência na habitação, pelo que a conta ao fim do mês tende a subir. O decreto-lei do Governo não detalha este assunto, mas a opinião dos advogados contactados pelo Público é que os trabalhadores podem recuperar o valor extra que estão a pagar por esses serviços – principalmente nas situações em que o teletrabalho se prolonga por vários meses.

No entanto, devem demonstrar em detalhe a variação das despesas face a períodos anteriores de trabalho regular ‘normal’, para encontrar a diferença.

Telmo Semião lembra que a ausência de trabalhadores numa empresa não é garantia de uma grande redução de despesas, nomeadamente as fixas como as instalações. O advogado da CRS destaca que “este regime é temporário e visto como um benefício para o trabalhador. Acresce que este também deixará de realizar despesas com a sua deslocação para o local de trabalho, por exemplo”. Posição que defende também para uma questão ainda mais particular, a dos trabalhadores que têm acesso a refeições gratuitas ou a baixo custo na empresa.

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Como em tudo, o bom senso também conta e na maior parte das empresas deverá ser fácil encontrar um ponto de equilíbrio, principalmente se a pandemia não teve efeitos graves nas contas ou se, por outro lado, os trabalhadores tiverem em conta a situação delicada da operação.

Saiba que, tanto empregadores como trabalhadores, devem manter ao máximo o teletrabalho quando este é obrigatório. As exceções estão apenas relacionadas com a falta de condições em casa para exercer as funções ou com a impossibilidade de as funções serem exercidas fora do local de trabalho habitual.

Quando o patrão bate à porta

No geral, o teletrabalho trouxe dúvidas a muitas empresas e profissionais, principalmente o medo da redução da produtividade de um lado, ou o receio de alargamento de horários e intrusão na vida pessoal do outro. Nisto o Código do Trabalho já salientava a obrigação do empregador “respeitar a privacidade do trabalhador e os tempos de descanso e repouso da família deste, bem como proporcionar-lhe boas condições de trabalho, tanto do ponto de vista físico como psíquico”.

Não quer isso dizer que a empresa não possa verificar a atividade do trabalhador em sua casa ou na morada de teletrabalho, bem como os equipamentos que lhe forneceu. Mas uma visita deste tipo só pode acontecer entre as 9h e as 19h.

Trabalhadores satisfeitos, empresas saudáveis

Se é certo que a pandemia pôs em risco a atividade de muitas empresas pelo lado das receitas, manter a produtividade e a moral das equipas alta também é fundamental. Há muitos casos um pouco por todo o mundo de empregadores que ofereceram dinheiro logo à partida ou comprometeram-se a dar aos trabalhadores o que precisavam de material de escritório para casa, mesmo não havendo obrigação legal.

Um bom exemplo é a Blip, uma tecnológica do Porto que, depois de oferecer 250 euros em plafond a cada um dos seus 360 trabalhadores, para aquisição de equipamento, decidiu acrescentar em novembro mais 400 euros integrais para ajudar a pagar o consumo de energia ao longo do inverno. “Apercebemo-nos de que a pandemia não passaria rapidamente e que estaríamos a trabalhar a partir de casa vários meses”, explicou ao Contas Connosco Sara Sousa, diretora de recursos humanos da Blip. “Tendo em conta que nem todos os nossos colaboradores possuíam as condições ideais, tomámos a decisão de atribuir este valor”, explicou a responsável, assumindo que “algumas pessoas tinham mencionado estar preocupadas com as condições para trabalhar a partir de casa”. Além destes dois ‘bónus’, Sara Sousa destaca ainda a importância, ao longo do ano, do sistema criado de “assistência a colaboradores e agregados, com acesso gratuito a apoio psicológico e aconselhamento financeiro ou fiscal”. A tecnológica portuense implementou também uma política de férias que aumenta os dias anuais a gozar em função da antiguidade, até um máximo de 30 dias, e prepara ainda outras medidas para o final do ano e para 2021 “em reconhecimento do esforço feito”.

Nos Estados Unidos os valores do ‘Fundo para o escritório em casa’, uma expressão que entretanto já foi generalizada por lá, situam-se entre 500 e 1000 dólares (420 a 840 euros).

Twitter, Shopify ou Basecamp foram algumas das empresas que optaram pela quantia máxima. Além de secretárias, cadeiras ou acessórios tecnológicos, a iluminação também é tida em conta na altura de melhorar o posto de trabalho caseiro. Outras  empresas definiram, além de um valor inicial para investimento, apoios mensais ou anuais para os trabalhadores suportarem o acréscimo de despesas. Um inquérito da seguradora norte-americana Aon a 1400 empresas indicou que mais de 20% ajudaram a pagar equipamento para casa aos trabalhadores. E outro estudo, da consultora Mercer, concluiu que mais de 20% das empresas estão a compensar os colaboradores por terem de utilizar o computador pessoal.

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