Formação profissional no trabalho: o que diz a lei?
Daniela CunhaA formação profissional está contemplada no Código do Trabalho. Saiba como funciona e se a sua empresa é obrigada a oferecer-lhe esta opção.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, 58,9% das empresas portuguesas com 10 ou mais trabalhadores oferecem formação no posto de trabalho e 18,3% dão formação profissional inicial aos seus colaboradores.
Estes dados mostram bem a importância que, cada vez mais, se dá à qualificação profissional contínua, que é vantajosa, quer para os trabalhadores, quer para as empresas.
Ao terem a oportunidade de participar regularmente em ações de formação, os trabalhadores mantêm-se motivados e atualizados sobre a sua área de atividade e podem, até, adquirir novos conhecimentos que lhes permita avançar na carreira.
Por outro lado, ao ajudarem os colaboradores a melhorar a produtividade, as formações permitem às empresas reduzir a rotatividade de trabalhadores e tornarem-se mais competitivas no mercado de trabalho.
A formação profissional na lei
Segundo o Código do Trabalho, as empresas são obrigadas a dar a pelo menos 10% dos seus trabalhadores formação profissional adequada ao desenvolvimento das suas qualificações, com o objetivo de melhorar a sua empregabilidade e aumentar a produtividade e competitividade da empresa.
De acordo com a lei, a formação contínua também tem como objetivos:
- Proporcionar qualificação inicial a quem está a entrar no mercado de trabalho;
- Assegurar a aprendizagem contínua dos funcionários da empresa;
- Promover a qualificação ou reconversão profissional de trabalhadores que estejam em risco de desemprego;
- Promover a reabilitação profissional de trabalhadores com deficiência, especialmente se esta resultar de um acidente de trabalho;
- Promover a integração dos trabalhadores.
Assim, é dever da entidade patronal estruturar planos de formação anuais ou plurianuais e assegurar que os colaboradores têm acesso às horas de aprendizagem previstas, seja através de ações realizadas na empresa ou da concessão de tempo para que possam frequentar formações por sua iniciativa.
As empresas também têm o dever de reconhecer e valorizar a qualificação adquirida pelos seus trabalhadores.
A quantas horas de formação é que os trabalhadores têm direito?
Depende da modalidade do contrato de trabalho. Por norma, em cada ano, os colaboradores têm direito a um mínimo de 40 horas de formação contínua. No entanto, caso sejam trabalhadores com contrato a termo por período igual ou superior a três meses, têm direito às horas de formação proporcionais à duração do contrato.
Já para um trabalhador temporário, a empresa tem de assegurar formação profissional sempre que a duração do contrato, incluindo renovações, ou a soma dos contratos de trabalho temporário sucessivos durante um ano seja superior a três meses. A formação deve durar, no mínimo, oito horas.
Para quem tem o estatuto de trabalhador-estudante, as horas de dispensa do trabalho para frequentar aulas e as faltas para prestar provas de avaliação são consideradas horas de formação.
As horas de formação são descontadas do ordenado?
Não. Uma vez que a lei determina a obrigatoriedade de formação contínua e prevê que essas horas devam ser prestadas durante o período normal de trabalho, o tempo em que um trabalhador esteja em formação é remunerado como habitualmente.
A formação pode acontecer fora do período laboral?
Ainda que esteja previsto que as formações aconteçam durante o período normal de trabalho, a empresa pode decidir que estas sejam dadas fora do horário laboral. No entanto, os trabalhadores têm de ser compensados.
Até às duas horas diárias, o tempo de formação é pago pelo valor normal (ou seja, o vencimento do trabalhador à hora). Se a formação ultrapassar as duas horas, deve ser paga de acordo com o que está estabelecido na lei para o trabalho suplementar: 50% pela primeira hora e 75% pelas horas seguintes, em dias úteis, e 100% por cada hora nos dias de folga do trabalhador.
Os trabalhadores são obrigados a participar?
Sim. De acordo com o artigo 128.º do Código do Trabalho, os trabalhadores têm o dever de participar de forma diligente nas ações de formação profissional que sejam promovidas pela entidade empregadora.
No fundo, a formação é tanto um dever da empresa como do trabalhador.
Quem é que pode dar a formação?
A formação profissional contínua pode ser prestada pelo próprio empregador, por uma entidade formadora certificada ou por um estabelecimento de ensino reconhecido pelo Ministério da Educação.
Segundo a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), as formações não têm de ser certificadas. A certificação só é obrigatória se houver acesso a financiamento público. Assim, a formação pode ser prestada pelo empregador, por um trabalhador da empresa ou por um formador externo, desde que tenham os conhecimentos profissionais necessários para o efeito e que os conteúdos coincidam com a atividade dos trabalhadores.
Quais são os conteúdos das formações?
Regra geral, a área da formação é definida por acordo entre empregador e funcionários. Caso não haja consenso, é escolhida pela entidade patronal e deve coincidir com a atividade prestada pelos trabalhadores.
Se a ação de formação não for relacionada com a atividade profissional, podem ser dados conteúdos sobre tecnologias de informação e comunicação, segurança e saúde no trabalho ou língua estrangeira.
E dão direito a certificado?
Sim. A frequência de uma formação profissional dá direito à emissão de um certificado e ao registo na Caderneta Individual de Competências nos termos do regime jurídico do Sistema Nacional de Qualificações.
O que acontece se a empresa não promover ações de formação contínua?
Caso as horas de formação previstas não sejam asseguradas pela entidade patronal num prazo de dois anos, são transformadas em crédito de horas para formação por iniciativa do trabalhador.
Esse crédito de horas é considerado como período normal de trabalho e, por isso, dá direito a retribuição e conta como tempo de serviço. Ou seja, se o trabalhador for despedido essas horas têm de ser convertidas em remuneração.
Os trabalhadores têm o direito de utilizar o crédito de horas para frequentar formações fora do local de trabalho, mas têm de avisar a empresa com a antecedência mínima de 10 dias. Também pode ser estipulado um subsídio para o pagamento da formação, até ao valor da retribuição do período de crédito de horas utilizado.
Os créditos de horas que não forem utilizados vencem ao fim de três anos.
O direito a formação em caso de cessação do contrato de trabalho
Cessando o contrato de trabalho, por qualquer uma das partes, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao número mínimo anual de horas de formação que não lhe tenha sido proporcionada (incluindo no ano de cessação) ou ao crédito de horas para formação a que tenha direito à data do final do contrato.