Direitos e Deveres

Estatuto trabalhador-estudante: a fórmula para conciliar os dois mundos

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Rapariga ruiva conhece o estatuto do trabalhador-estudante

Quem trabalha e estuda ao mesmo tempo tem direito a um estatuto especial. Descubra em que consiste, quais são os seus direitos e deveres e como o pedir.

Seja porque precisam (ou querem) ganhar algum dinheiro enquanto estudam, ou porque querem melhorar as suas qualificações, mesmo já estando no mercado de trabalho, há muitos portugueses que conciliam os estudos com um emprego.

Para facilitar um pouco a vida dessas pessoas, foi criado um benefício legal que as protege e lhes dá alguns direitos: o estatuto de trabalhador-estudante. No entanto, para poder usufruir de todas as vantagens, o estatuto também prevê que o beneficiário tenha algumas obrigações a cumprir.

Se está – ou tenciona vir – a estudar e trabalhar ao mesmo tempo, é essencial que saiba como funciona o estatuto de trabalhador-estudante, quais são os seus direitos e deveres e como o pode pedir. Neste artigo, damos-lhe, ainda, algumas sugestões para conciliar a vida laboral com a vida estudantil.

O que é o estatuto trabalhador-estudante?

O estatuto de trabalhador-estudante está consagrado no artigo 89.º do Código do Trabalho. Assim, de acordo com a lei, é considerado trabalhador-estudante qualquer pessoa que trabalhe e, ao mesmo tempo, frequente:

  • Qualquer nível de educação escolar;
  • Um curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento;
  • Um curso de formação profissional;
  • Um programa de ocupação temporária para jovens com duração igual ou superior a seis meses.

Além dos trabalhadores por conta de outrem, este estatuto também se aplica a quem trabalha por conta própria. Os trabalhadores abrangidos que, entretanto, ficaram em situação de desemprego involuntário e estejam inscritos num centro de emprego não perdem o estatuto.

Quais são os direitos que o estatuto trabalhador-estudante garante?

A grande vantagem de ter estatuto de trabalhador-estudante é que garante ao beneficiário direitos (no emprego e no estabelecimento de ensino) que tornam mais fácil conjugar as duas vertentes.

Horário de trabalho

De acordo com a lei, o horário de trabalho de quem tem estatuto de trabalhador-estudante deve, sempre que possível, ser ajustado de forma a permitir que este frequente as aulas. Se a entidade empregadora não conseguir fazer esse ajuste, o trabalhador-estudante tem direito a ser dispensado do trabalho para ir às aulas. Nessa situação, o trabalhador não pode perder direitos, já que a dispensa é considerada prestação efetiva de trabalho.

Esta dispensa pode ser utilizada pelo trabalhador-estudante de uma só vez ou de forma fracionada e tem uma duração máxima, de acordo com o período normal de trabalho:

  • Três horas semanais: para períodos de trabalho iguais ou superiores a 20 horas e inferiores a 30 horas;
  • Quatro horas semanais: para períodos de trabalho iguais ou superiores a 30 horas e inferiores a 34 horas;
  • Cinco horas semanais: para períodos de trabalho iguais ou superiores a 34 horas e inferiores a 38 horas;
  • Seis horas semanais: para períodos de trabalho iguais ou superiores a 38 horas.

Quem trabalha por turnos tem direito a preferência na escolha de um posto de trabalho e horário compatível com a sua qualificação profissional e com a frequência das aulas.

Caso o horário de trabalho ajustado ou a dispensa para frequentar as aulas comprometa o funcionamento da empresa, o empregador deve tentar promover um acordo entre o trabalhador e a comissão ou sindicato responsável. Na falta de acordo, a empresa toma uma decisão e tem de informar o trabalhador por escrito.

O trabalhador-estudante não está obrigado a fazer horas extra, exceto por motivos de força maior, nem a trabalhar em regime de adaptabilidade, banco de horas ou horário concentrado, caso este coincida com as aulas ou com provas de avaliação. Se trabalhar nalgum destes regimes, o trabalhador-estudante tem direito a um dia por mês de dispensa, que conta como prestação efetiva de trabalho. Já os trabalhadores que fazem horas extra têm direito a descanso compensatório no mesmo número de horas.

Faltas justificadas

De acordo com o Código do Trabalho, o trabalhador-estudante pode faltar, de forma justificada:

  • Para realizar provas de avaliação. Pode faltar no dia da prova e no anterior. Caso haja várias provas em dias consecutivos ou mais do que uma avaliação no mesmo dia, os dias anteriores são tantos quantas as provas a realizar e incluem os dias de descanso semanal e os feriados;
  • Para se deslocar para a realização de provas de avaliação. Neste caso, tem direito a até 10 faltas em cada ano letivo.

O trabalhador-estudante pode faltar quatro vezes por disciplina em cada ano letivo, podendo este direito ser exercido apenas em dois anos letivos relativamente a cada disciplina. Apesar de não precisar de pedir autorização ao empregador para faltar, o trabalhador-estudante deve comunicar a sua ausência com, pelo menos, cinco dias de antecedência.

Férias

No que diz respeito às férias, os trabalhadores-estudantes podem marcá-las de acordo com as suas necessidades escolares e podem gozar até 15 dias de férias interpoladas. Contudo, o período de férias escolhido tem de ser sempre compatível com as exigências ao funcionamento da empresa.

Quem tem este estatuto pode, ainda, em cada ano civil, tirar uma licença sem vencimento com a duração de 10 dias úteis seguidos ou alternados. O pedido deve ser feito com antecedência, dependendo do número de dias de licença:

  • Um dia de licença: 48 horas antes ou, não sendo viável, logo que possível;
  • Dois a cinco dias de licença: oito dias antes;
  • Mais de cinco dias de licença: 15 dias antes.

Benefícios no estabelecimento de ensino

Ser trabalhador-estudante também dá algumas regalias na instituição de ensino:

  • Não está sujeito a frequentar um número mínimo de disciplinas;
  • Não está sujeito a regimes de prescrição ou que impliquem a mudança de estabelecimento de ensino;
  • O seu aproveitamento escolar não depende da frequência de um número mínimo de aulas por disciplina;
  • Não está sujeito a limitações no número de exames a realizar na época de recurso. Caso esta época não exista, o trabalhador-estudante tem direito a uma época especial de exame em todas as disciplinas;
  • Quando as aulas são em horário pós-laboral, o estabelecimento de ensino deve assegurar que os exames, as provas de avaliação e um serviço mínimo de apoio ao trabalhador-estudante decorrem, sempre que possível, no mesmo horário;
  • Tem direito a aulas de compensação ou de apoio pedagógico, caso sejam consideradas imprescindíveis pela escola.
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Bolsa de estudo

Quem tem o estatuto de trabalhador-estudante pode acumular o salário com bolsas de estudo. De acordo com as novas regras, que reforçam os apoios aos alunos do ensino superior, os rendimentos que vão até 14 vezes o valor do salário mínimo (ou seja, até 11.480 euros), não entram no cálculo para efeitos de atribuição de bolsa.

Obrigações de quem tem o estatuto trabalhador-estudante

Para poder usufruir das regalias do estatuto de trabalhador-estudante, o beneficiário também tem alguns deveres a cumprir. Antes de mais, deve comprovar perante a entidade patronal a sua condição de estudante, entregando o horário das aulas. Além disso, o trabalhador-estudante tem o dever de escolher o horário mais compatível com o horário laboral.

Ao ter este estatuto, o trabalhador-estudante também fica sujeito a controlo de assiduidade. Caso haja acordo com o trabalhador, este controlo pode ser feito diretamente pela empresa, através dos serviços administrativos da instituição de ensino. Por norma, a escola envia documentação escrita a referir a data e hora do fim das responsabilidades académicas. Se não houver acordo, a entidade patronal pode pedir uma prova da frequência nos 15 dias seguintes à utilização da dispensa para provas de avaliação.

O trabalhador-estudante também tem de comprovar perante a empresa o aproveitamento escolar no final de cada ano letivo.

Como pedir estatuto de trabalhador-estudante

Para beneficiar do estatuto de trabalhador-estudante, tem de provar à sua entidade patronal que está a estudar. Para isso, deve apresentar um comprovativo de matrícula e o seu horário letivo. Também deve provar no estabelecimento de ensino que é trabalhador, entregando uma declaração do seu emprego ou um comprovativo de inscrição na Segurança Social.

No final de cada ano letivo, tem de demonstrar que teve aproveitamento escolar para que o estatuto seja renovado. É considerado como aproveitamento:

  • A transição de ano;
  • A aprovação em, pelo menos, metade das disciplinas em que o trabalhador-estudante está matriculado;
  • A aprovação em metade dos módulos ou unidades equivalentes de cada disciplina, definidos pelo estabelecimento de ensino para o ano letivo ou para o período anual de frequência (apenas para os cursos organizados em módulos que não definem condições de transição de ano).

Contudo, estão previstas algumas exceções na lei. Os trabalhadores-estudantes que tenham tido um acidente de trabalho ou doença profissional, que sofram de doença prolongada ou que gozem de licença parental, licença de adoção ou licença por gravidez de risco também são considerados como tendo tido aproveitamento escolar.

É possível perder o estatuto?

Sim. O estatuto é mantido enquanto forem cumpridos todos os requisitos. Se o trabalhador-estudante não tiver aproveitamento escolar no ano em que beneficia do estatuto perde os direitos relacionados com horários, férias e licenças. Os restantes direitos terminam se o trabalhador-estudante não tiver aproveitamento em dois anos consecutivos ou três intercalados.

Caso preste declarações falsas ou utilize os direitos para outros fins (por exemplo, faltar ao trabalho por causa de um exame e não comparecer à prova), o trabalhador-estudante perde o estatuto de imediato.

No entanto, esta perda não é irreversível. Pode recuperar o estatuto no ano seguinte, mas esta situação não pode acontecer mais de duas vezes.

4 dicas para conciliar os estudos com o trabalho

Equilibrar a vida profissional com a vida académica pode ser difícil. Contudo, com alguma organização e força de vontade tudo é possível.

1. Estabeleça objetivos

Fazer uma licenciatura, um mestrado, um doutoramento ou uma formação de apenas alguns meses não é a mesma coisa. Por isso, dependendo do tipo de curso que quer tirar, deve definir metas e calcular quanto tempo irá demorar a atingi-las. Assim, será mais fácil organizar o seu trabalho e o estudo e garantir que atinge os seus objetivos.

2. Organize o seu tempo

Quem estuda e trabalha tem os dias contados ao minuto. Por isso, para que consiga realizar todas as suas tarefas, é essencial que crie um plano de estudos e que aponte no calendário, assim que possível, todas as datas dos testes, exames e entregas de trabalhos.

Tente, também, estudar um pouco todos os dias para não acumular a matéria toda para as vésperas das avaliações e rentabilize o seu tempo livre para adiantar algum trabalho académico. Não se esqueça de garantir que também tem tempo para descansar e estar com a família.

3. Fale com o seu chefe e com os seus professores

É importante que mantenha a chefia e os professores a par dos seus progressos e das suas dificuldades, quer do lado profissional, quer do lado académico. Ao conhecerem a sua situação podem ajudá-lo e até facilitar algumas tarefas.

4. Cuide do seu bem-estar

Com tanto trabalho para fazer, é possível que comece a negligenciar aspetos da sua vida, como o sono, a alimentação e o exercício físico. No entanto, é precisamente nas alturas de maior pressão que deve manter estes hábitos para que não se deixe ir abaixo. Poucas horas de sono ou uma alimentação descuidada podem levar a problemas físicos que, com o tempo, fazem com que seja ainda mais difícil manter-se a par das tarefas profissionais e do trabalho escolar.

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