O impacto do salário mínimo na distribuição do rendimento
O impacto do salário mínimo é notado não só na distribuição de rendimentos – até porque serve de referência para apoios sociais – mas também na dinamização da economia. Afinal, se não houvesse um valor mínimo a pagar, os ordenados poderiam ser mais baixos e o consumo menor.
Em Portugal, o salário mínimo foi instituído a 27 de maio de 1974 com o objetivo de satisfazer “as aspirações das classes trabalhadoras e dinamizar a atividade económica”.
Hoje em dia, a retribuição mínima mensal garantida (RMMG) é encarada como “um fator de coesão social bem como um instrumento primordial na diminuição das disparidades sociais”. O que mudou e o que se passa no resto do mundo? Explicamos-lhe tudo.
Índice de conteúdos:
- O que é o salário mínimo?
- O salário mínimo em Portugal
- Qual a sua importância?
- Que países têm um salário mínimo?
- Como funciona o salário mínimo na União Europeia?
O que é o salário mínimo?
O salário mínimo é um valor definido pelo Estado como o limite mais baixo que os empregadores podem pagar aos seus trabalhadores.
A necessidade de determinar “um salário adequado para manter um padrão de vida razoável, como é entendido no seu tempo e no país” começou a ser discutida há mais de 100 anos, no âmbito do Tratado de Versalhes (1919) – que pôs fim à I Guerra Mundial – e da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
No entanto, e apesar de todas as discussões que se seguiram, nunca foi definida uma noção do salário adequado, nem determinadas as necessidades básicas que o salário mínimo deveria assegurar.
Mais de 100 anos depois, nem todos os países adotaram ainda um salário mínimo e, mesmo a nível da União Europeia (UE), continuam a existir diferenças entre os Estados-Membros quanto à cobertura dos trabalhadores ao nível dos salários mínimos.
O salário mínimo em Portugal
Em Portugal o salário mínimo existe desde maio de 1974. Nessa altura, foi instituído um valor de 3.300 escudos mensais, o que, aplicando a taxa de conversão de escudos para euros (e sem fazer contas à inflação) seria hoje o equivalente a 16,46 euros.
Segundo dados do Banco de Portugal (BdP), a evolução do salário mínimo em Portugal nem sempre acompanhou a inflação, o que significa que nem todos os aumentos se traduziram na subida do poder de compra.
Só em 2017 o valor do salário mínimo foi indexado à inflação. Em 2025 a retribuição mínima mensal garantida está nos 870 euros.
O impacto do salário mínimo em Portugal
Em 1973, antes de ser instituído o salário mínimo, um quinto dos trabalhadores recebia um salário médio inferior a 10,6 euros (valor convertido dos escudos) e a disparidade salarial era elevada: os trabalhadores nos setores mais bem pagos tinham salários pelo menos 3,5 vezes superiores aos dos setores com salários mais baixos. Essa disparidade baixou para 2,7 salários entre 1973 e 1975 e em 2022 era de 3,1 salários.
Em 2024, cerca de 838 mil trabalhadores portugueses (21% do total) recebiam o salário mínimo. Mas 3,4 milhões recebiam menos de 1.000 euros mensais, o que significa que uma grande fatia de assalariados recebia pouco mais do que a RMMG.
Serão estes valores suficientes para “manter um padrão de vida razoável” preconizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) desde 1919?
De acordo com os dados da Numbeo, uma plataforma que calcula o custo de vida em várias cidades do mundo, as despesas mensais estimadas para uma família de quatro pessoas em Lisboa (excluindo arrendamento) são cerca de 2.657,4 euros. Se somarmos um arrendamento, este valor sobe para 4.605 euros, enquanto no Porto é de 3.900 euros.
Olhando para os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), a despesa anual média dos agregados familiares foi, em 2022/2023, de 23.900 euros. Ou seja, cerca de 2.000 euros por mês.
Qual a importância de existir um salário mínimo?
A existência de um salário mínimo obrigatório é importante para garantir que as pessoas que trabalham recebem um valor que lhes permita satisfazer as necessidades básicas como habitação, alimentação e saúde. É, também, uma forma de proteger os direitos laborais e de reduzir a desigualdade social.
O facto de existir um salário mínimo contribui para o consumo, o que, por sua vez, tem impacto na economia.
O salário mínimo é ainda usado como referência para calcular o mínimo de existência no IRS – ou seja, o valor até ao qual não se paga imposto –, bem como alguns apoios sociais e isenções.
Desvantagens do salário mínimo
O salário mínimo tem, no entanto, algumas desvantagens. Por exemplo, a aproximação do salário mínimo ao salário médio é, para alguns economistas, limitativa em termos de progressão salarial, sobretudo para os trabalhadores cujo ordenado está um pouco acima do mínimo.
Além disso, o facto de nem sempre os aumentos do salário mínimo refletirem aumentos de produtividade é outra desvantagem apontada.
Para as pequenas e médias empresas pode também ser uma desvantagem em termos de competitividade. Sempre que o salário mínimo aumenta, aumentam também os custos com cada trabalhador.
Por exemplo, entre 2024 e 2025 o salário mínimo subiu 50 euros, o que implicou também uma subida da Taxa Social Única (TSU) que as empresas pagam à Segurança Social: em 2024 o valor da TSU para um salário mínimo foi de 194,75 euros, mas em 2025 subiu para 206,63 euros por cada trabalhador com o salário mínimo.
Quais os países que têm um salário mínimo?
Nem todos os países estabelecem um salário mínimo nacional e, entre os que o fazem, os critérios e valores variam bastante. Além disso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) não dispõe de dados atualizados e uniformizados que permitam uma comparação rigorosa entre países.
De qualquer forma, esta é a lista, por continente, dos países que adotaram um salário mínimo:
Europa | Luxemburgo, Alemanha, Bélgica, Países Baixos, Irlanda, Mónaco, Reino Unido, França, São Marino, Andorra, Eslovénia, Espanha, Macedónia do Norte, Chipre, Lituânia, Malta, Grécia, Portugal, Polónia, Chéquia, Estónia, Croácia, Eslováquia, Letónia, Hungria, Roménia, Montenegro, Turquia, Bulgária, Albânia, Sérvia, Bósnia Herzegovina, Bielorrússia, Moldávia, Rússia, Ucrânia, Casaquistão, Geórgia, Áustria, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Itália, Noruega e Suíça. |
Américas | Estados Unidos da América, Bahamas, Barbados, Antígua e Barbuda, Costa Rica, Saint Kitts and Nevis, Uruguai, Chile, Belize, Equador, Trindade e Tobago, Dominica, Honduras, Argentina, Jamaica, Bolívia, Paraguai, República Dominicana, México, Peru, Brasil, Colômbia, Guatemala, Panamá, El Salvador, Granada, Guiana, Nicarágua, Cuba, Haiti, Venezuela e Canadá. |
Ásia | Israel, Coreia do Sul, Taiwan, Macau, Hong Kong, Omã, Palestina, Jordânia, Malásia, Tailândia, Qatar, Azerbaijão, Cambodja, Kuwait, Arménia, Iraque, Irão, Turquemenistão, Vietname, Nepal, Mongólia, Timor-Leste, Uzbequistão, Afeganistão, Paquistão, Myanmar, Laos, Butão, Líbano, Sri Lanka, Tajiquistão, Bangladesh, Quirguistão e Síria. |
África | Gabão, África do Sul, Maurícias, Guiné Equatorial, Marrocos, Zimbabué, República Democrática do Congo, Argélia, Botsuana, Cabo Verde, Costa do Marfim, Comores, Guiné Bissau, Líbia, Mauritânia, Egipto, Togo, Chade, Libéria, Moçambique, Benim, Nigéria, Angola, Camarões, República Centro-Africana, Burkina Faso, Quénia, Zâmbia, Nigéria, Tanzânia, Lesoto, Malaui, Uganda, Gana, Serra Leoa, Eswatini, Seychelles, Gâmbia, Etiópia, Burundi e Sudão. |
Oceania e Austrália | Nova Zelândia, Austrália, Palau, Ilhas Marshall, Vanuatu, Fiji, Papua Nova-Guiné, Samoa, Kiribati e Ilhas Salomão. |
Como funciona o salário mínimo na União Europeia?
Na UE há dois tipos de salários mínimos: os que estão previstos na lei, como acontece em Portugal, e os que resultam de negociação coletiva, ou seja, de acordos intersetoriais nacionais, entre sindicatos e empregadores), como acontece na Áustria, Chipre, Dinamarca, Finlândia, Itália e Suécia.
Salários mínimos na União Europeia em 2025
Para efeitos estatísticos, a UE divide o salário anual pelo número de meses em que os trabalhadores recebem ordenado. Assim, em países como Grécia, Espanha e Portugal, os dados foram ajustados para 14 meses, o que significa que, nos dados do Eurostat, o salário mínimo em Portugal é de 1.015 euros.
Nos países em que o valor do salário mínimo é determinado com base no valor/hora, como é o caso da Alemanha, França, Irlanda e Países Baixos, também foi feita a devida conversão:
- Luxemburgo: 2.638 euros
- Irlanda: 2.282 euros
- Países Baixos: 2.193 euros
- Alemanha: 2.161 euros
- Bélgica: 2.070 euros
- França: 1.802
- Espanha: 1.381 euros
- Eslovénia: 1.278 euros
- Polónia: 1.091 euros
- Lituânia: 1.038 euros
- Portugal: 1.015 euros
- Chipre: 1.000 euros
- Croácia: 970 euros
- Grécia: 968 euros
- Malta: 961 euros
- Estónia: 886 euros
- República Checa: 826 euros
- Eslováquia: 816 euros
- Roménia: 814 euros
- Letónia: 740 euros
- Hungria: 707 euros
- Bulgária: 551 euros
O Eurostat criou igualmente uma unidade que permite comparar os valores entre países com base no poder de compra. Esta unidade monetária artificial designa-se “paridade do poder de compra” ou “poder de compra padrão” (Purchasing Power Standard, PPS) e permite dividir os países da UE em três grupos:
- Salário mínimo superior a 1.250 PPS: Luxemburgo, Alemanha, Países Baixos, Bélgica, França, Irlanda, Polónia, Espanha e Eslovénia;
- Salário mínimo entre 1.000 e 1.250 PPS: Roménia, Lituânia, Grécia, Croácia, Chipre, Portugal e Malta;
- Salário mínimo inferior a 1.000 PPS: Hungria, Chéquia, Eslováquia, Estónia, Letónia e Bulgária.