Conhece os direitos dos doentes oncológicos no trabalho?
Lidar com uma doença como o cancro significa tratamentos longos com efeitos na capacidade física, consultas e exames regulares, internamentos, e o medo que o problema se agrave, ou reapareça já depois de ser eliminado. Equilibrar tudo isso com a manutenção de um emprego ou de uma carreira torna o dia a dia ainda mais difícil. Mas além do apoio cada vez maior da sociedade civil e de organizações ligadas ao cancro, a própria legislação protege mais os trabalhadores afetados pela doença.
Guia da Liga Portuguesa Contra o Cancro junta todos os direitos
A maioria dos direitos dos trabalhadores relacionados com a saúde – desde as baixas médicas à assistência à família – são semelhantes, independentemente do tipo de doença. No entanto, existem alguns direitos laborais específicos para doentes oncológicos, inscritos na lei desde 2019. Compõem apenas uma parte do guia que a Liga Portuguesa Contra o Cancro divulga há vários anos sobre os direitos dos doentes com cancro, que já vai na sua quarta edição. No guia Direitos Gerais do Doente Oncológico, a LPCC reúne a informação relacionada com o SNS, Segurança Social, Fiscalidade, Trabalho, e legislação específica para os Açores ou para a Madeira.
Doença oncológica não impede carreira
O trabalhador com doença oncológica “é equiparado, no plano dos direitos e deveres laborais, aos demais trabalhadores no acesso ao emprego, à formação profissional, à evolução na carreira e nas condições de trabalho, exceto no que especificamente respeite à sua situação”. A frase, do guia da LPCC, resume o contexto laboral e a garantia de que o salário, a progressão profissional e o aumento de responsabilidade não devem estar limitados no caso de trabalhadores com cancro. Esses direitos e deveres iguais passaram a estar incluídos no artigo 85.º do Código do Trabalho – após a aprovação da Lei n.º 93/2019 – que antes referia apenas os trabalhadores com deficiência ou doença crónica.
O mesmo artigo 85.º indica ainda que “o Estado deve estimular e apoiar a ação do empregador na contratação de trabalhador com deficiência, doença crónica ou doença oncológica e na sua readaptação profissional”. Já o n.º 87 destaca que “o empregador deve adotar medidas adequadas para que a pessoa com deficiência ou doença crónica, nomeadamente doença oncológica ativa em fase de tratamento, tenha acesso a um emprego, o possa exercer e nele progredir, ou para que tenha formação profissional, exceto se tais medidas implicarem encargos desproporcionados”.
Discriminação positiva em concursos a postos de trabalho
Ainda no domínio da ‘carreira’, caso os doentes oncológicos tenham uma incapacidade de 60% ou mais, definida no Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, conseguem também algumas vantagens em concursos para preenchimento de vagas na administração pública. O decreto-lei 29/2001 estipula uma reserva de 5% das vagas – em concursos para preencher mais de 10 -, para pessoas, com deficiência ou doença, que tenham uma incapacidade igual ou superior a 60%. Se as vagas forem entre 3 e 10, uma fica garantida para esses candidatos. E se houver apenas duas vagas, em caso de classificação igual, dá-se preferência a candidaturas de trabalhadores com a incapacidade acima referida.
Maior garantia de horário para doentes oncológicos
Ser um doente oncológico é uma das razões admissíveis para recusar trabalhar horas extraordinárias. Além disso, os trabalhadores com cancro não podem ser obrigados a cumprir um horário concentrado, estar num regime de banco de horas ou trabalhar entre as 20h e as 7h do dia seguinte, caso isso possa colocar em causa a sua saúde e segurança. O empregador deve ainda garantir a adaptação do posto de trabalho às capacidades do seu funcionário, bem como promover apoio ou ações de formação apropriadas à sua situação.
A parentalidade está protegida
Outras alterações à legislação, nomeadamente a Lei n.º 90/2019, também vieram reforçar os direitos dos trabalhadores em termos de parentalidade. Além de ser proibida qualquer forma de discriminação salarial ou de carreira que tenha como base o exercício de direitos de parentalidade por parte de trabalhadores, a licença para assistência a um filho com doença oncológica juntou-se à deficiência e doença crónica, que já estava prevista.
Assim, quem tiver um filho com cancro pode tirar uma licença para assistência de seis meses, prolongável até 4 anos. Caso a criança tenha mais de 12 anos, a necessidade de licença deve ser confirmada através de atestado médico. O limite máximo de tempo para a licença pode chegar a seis anos “nas situações de necessidade de prolongamento da assistência, confirmada por atestado médico”. Numa doença prolongada em estado terminal não se aplicam os limites máximos de licença.
Devido à grande necessidade de tratamentos, consultas e medicamentos, muitos dos direitos específicos dos doentes oncológicos estão relacionados diretamente com as despesas de saúde. No entanto existem também outros benefícios que podem conseguir, para facilitar um pouco a mobilidade e a gestão das despesas, ou até para salvaguardar a descendência e decidir sobre o seu futuro.