Direitos e Deveres

Como preparar o seu testamento?

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Testamento

Ninguém gosta de pensar na morte, mas a verdade é que, em períodos incertos, perante doenças ou com o envelhecimento natural, torna-se um tema inevitável.

A pandemia de Covid-19 veio demonstrar isso mesmo. Segundo o Bastonário da Ordem dos Notários, Jorge Batista Silva, em declarações a vários meios de comunicação social, houve “um aumento anormal” de pedidos de testamentos. As solicitações surgem sobretudo de profissionais de saúde ou de pessoas que pertencem a grupos de risco e por isso podem ter mais probabilidade de contrair o vírus.

No entanto, um testamento pode ser aplicado a todas as pessoas, independentemente da profissão ou grau de risco a que estão expostos. Se pretende evitar possíveis conflitos na sua família, prefere deixar a herança atribuída ainda em vida e toda a burocracia resolvida, saiba que fazer um testamento pode ser uma boa opção para si.

Testamento: o que é e como se faz

Um testamento é, por definição, “o ato unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles.” (artigo 2179.º, n.º 1, do Código Civil). Apesar de dizer respeito, sobretudo, a heranças, um testamento também pode incluir, segundo a Ordem dos Notários:

“disposições de caráter não patrimonial, como, por exemplo, a confissão, a perfilhação, a designação de tutor e a reabilitação de sucessor indigno”

Um testamento é um ato pessoal, como tal, não pode ser feito por outra pessoa nem por um representante. Os menores de idade não emancipados ou pessoas que tenham sido interditadas por anomalias psíquicas também não podem fazê-lo.

O testamento é um ato singular, ou seja, não pode ser feito, em conjunto, por mais do que uma pessoa. Além disso, é um documento revogável, o que significa que, se fizer um testamento e depois mudar de ideias, pode fazer outro e o que é válido, perante a lei, é sempre o mais recente.

De acordo com o Código Civil, existem dois tipos de testamentos: o testamento público e o testamento cerrado.

Testamento público

Segundo o artigo 2205º, é considerado público “o testamento escrito por notário no seu livro de notas”

Testamento cerrado

  • Segundo o artigo 2206º, o testamento diz-se cerrado, quando é escrito e assinado pelo testador ou por outra pessoa a seu rogo, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por este assinado.
  • O testador só pode deixar de assinar o testamento cerrado quando não saiba escrever ou não possa fazê-lo, ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por que o não assina (por exemplo, no caso de uma pessoa analfabeta terá de ficar atestado que não sabe assinar)
  • A pessoa que assina o testamento deve rubricar as folhas que não contenham a sua assinatura.
  • O testamento cerrado deve ser aprovado por notário, nos termos da lei do notariado.
  • A violação do disposto nos números anteriores importa nulidade do testamento
Não existe uma estrutura definida para a redação de um testamento, portanto pode ser qualquer pessoa a escrevê-lo. No entanto, é preciso que cumpra todas as exigências da lei e que seja reconhecido posteriormente por um notário. Em alternativa, poderá pedir a um notário que escreva por si.

Segundo o portal E-Portugal, o testamento pode ser realizado em qualquer cartório notarial privado ou público, exceto os seguintes:

  • Cartório Notarial de Competência Especializada de Aveiro.
  • Cartório Notarial de Competência Especializada de Matosinhos.
  • Cartório Notarial de Competência Especializada do Porto.
  • Cartório Notarial de Protesto de Letras de Lisboa.
  • Cartório Notarial de Protesto de Letras do Porto.

Pode pesquisar no site o posto de atendimento mais próximo de si.

Se estiver no estrangeiro pode deslocar-se aos serviços consulares correspondentes. Quanto a datas, pode ser feito a qualquer momento mediante agendamento. Por regra, é exigido que se faça acompanhar de duas testemunhas, mas, segundo o Bastonário da Ordem dos Notários, Jorge Batista da Silva, em declarações à SIC Notícias, por causa do aumento do número de pedidos no contexto da pandemia de Covid-19, os “testamentos urgentes podem ser dispensados da presença de duas testemunhas que, num período normal, é obrigatório”. Tanto para si como para as testemunhas vai precisar de apresentar os seguintes documentos:

  • Cartão de cidadão ou bilhete de identidade.
  • Documento equivalente, emitido pela autoridade competente de um dos países da União Europeia.
  • Carta de condução, emitida pela autoridade competente de um dos países da União Europeia ou passaporte.

O testamento público ou a aprovação de um testamento cerrado, em cartório notarial público, tem um custo de 159 euros e pode ser pago através de multibanco, dinheiro, cheque ou vale postal.

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Entender a lei: o que é a legítima e como respeitar

O primeiro fator a considerar quando trata da herança, decorrente dos bens que juntou em vida e que estão em seu nome, é o princípio da legítima, um ponto integrado no Código Civil em Portugal. Ao contrário do que acontece em muitos países (por exemplo, em Inglaterra, antes de morrer uma pessoa pode deixar todos os seus bens ao cão ou ao periquito, por exemplo) – existe um princípio básico na lei que determina que os seus herdeiros naturais ficam sempre salvaguardados. Ou seja, por mais que queira deixar de lhes atribuir algum dos seus bens, eles terão direito pelo menos a uma terça parte de tudo aquilo que possui. Por exemplo, no caso de se tratar do marido/mulher e de não existirem filhos do casal, o viúvo (a) tem direito natural a metade dos seus bens. A percentagem passa para 2/3 quando o casal tem filhos e, nesse caso, cônjuge e filhos concorrem em conjunto.

O princípio da legítima funciona apenas para herdeiros diretos e, por isso, não contempla herdeiros na linha colateral, isto é, irmãos, sobrinhos nem sobrinhos-netos. A legítima salvaguarda ainda os herdeiros diretos em caso de doações indevidas. Ou seja: se, em vida, decidiu doar algum dos seus bens, essa doação só é considerada válida se respeitar a legítima. Por exemplo, se tem duas casas e doou uma a alguém, essa casa será retirada a quem foi doada se representar mais do que a parte que corresponde aos seus herdeiros naturais (pais, marido/mulher, filhos, netos). Assim, sempre que isso aconteça, a doação será considerada indevida e reavaliada e o bem será devolvido a quem pertence segundo a lei.

O que acontece se não fizer testamento

Se decidir não fazer testamento, aplicam-se exclusivamente as regras da lei. Tal como está explicado no site da Fundação Francisco Manuel dos Santos, são herdeiros legítimos o cônjuge, os parentes e o Estado. A ordem por que são chamados a herdar é a seguinte:

  1. cônjuge e descendentes;
  2. cônjuge e ascendentes;
  3. irmãos e seus descendentes;
  4. outros parentes na linha colateral até ao 4.º grau;
  5. Estado.

Naturalmente, os primeiros a herdar são os parentes mais próximos do falecido, excluindo o direito dos mais afastados.

De acordo com a Deco, dentro de cada classe, os parentes mais próximos têm prioridade. Ou seja, os pais excluem os avós; os filhos afastam os netos e os parentes de 3.º grau impedem os de 4.º grau de receber algum bem. Se não sobreviver nenhum parente até ao 4.º grau da linha colateral (primo, sobrinho-neto), a herança fica para o Estado.

Na prática, se, por exemplo, o falecido deixar cônjuge e filhos ou só filhos, os pais não serão chamados à sucessão. Se não deixar filhos, mas os pais sobreviverem, apenas herdam os pais e os irmãos do falecido – se existirem – não recebem.

Segundo a Fundação Francisco Manuel dos Santos, existindo cônjuge e descendentes, a herança é dividida por tantas partes quantos esses herdeiros, desde que a parte que cabe ao cônjuge não seja inferior a um quarto da herança. Por outro lado, se não houver descendentes, o cônjuge fica com dois terços da herança e aos ascendentes cabe um terço. Por exclusão de partes, não existindo cônjuge nem descendentes, a totalidade da herança fica para os ascendentes.

No caso de viver em união de facto, o seu parceiro não é considerado seu herdeiro por lei. Em caso de morte e se vive em união de facto, o seu parceiro não terá direito a nenhum dos seus bens se não houver um testamento que dê conta dessa vontade.

Ainda assim, a lei prevê que o outro membro do casal possa viver na casa de morada da família pelo prazo de cinco anos.

Em que casos deve fazer testamento

  • Para evitar possíveis conflitos familiares em resultado da partilha da herança
  • Se quiser deixar toda a burocracia tratada e estipular a forma como a sua herança vai ser atribuída
  • Se quiser assegurar os direitos dos cônjuges ou unidos de facto, deixando-lhes, por exemplo, uma parcela dos bens ou o usufruto da casa de família
  • Se morar habitualmente no estrangeiro e tiver bens em vários países pode ser uma forma de organizar de forma antecipada a sua sucessão através da escolha da lei que lhe será aplicada

Em situações de separação com filhos menores, se quiser excluir o outro progenitor da possibilidade de administrar os bens que os seus filhos puderem herdar. A alternativa é nomear administradores para esses bens.

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