Empresas sustentáveis: são um bom negócio?
A sustentabilidade está na moda e já chegou às empresas
Desengane-se quem pensa que, no mundo dos negócios, é um conceito que diz respeito a finanças saudáveis. Vai muito além disso. Neste artigo, o Contas Connosco explica-lhe o que são empresas e negócios sustentáveis, como pode tornar a sua empresa (mais) sustentável, os custos e os benefícios de ir por este caminho e, se for investidor ou quiser dedicar-se a essa área, como pode identificar ativos sustentáveis.
O que é o desenvolvimento sustentável?
A preocupação com as alterações climáticas surgiu, pela primeira vez, ao mais alto nível, em 1972, na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano (CNUAH), realizada em Estocolmo. Segundo a Agência Portuguesa do Ambiente, a partir daqui, surgiu o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) e a Declaração do Ambiente, cujo primeiro princípio define que o homem tem direito a viver “num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem-estar, cabendo-lhe o dever solene de proteger e melhorar o ambiente para as gerações atuais e vindouras”.
Em 1983, o Secretário Geral das Nações Unidas pediu à primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, que criasse uma comissão especial independente para fazer um relatório sobre ambiente e desenvolvimento. Em 1987, foi apresentado o chamado relatório Brundtland que define Desenvolvimento Sustentável como um modelo de desenvolvimento que “responda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras darem resposta às suas próprias necessidades”.
Desde então ficou definido que ambiente e desenvolvimento são questões estritamente ligadas e já foram divulgadas mais quatro declarações das Nações Unidas nesse sentido.
Na prática, o desenvolvimento sustentável inclui as dimensões económica, ambiental e social.
Quais são os objetivos do desenvolvimento sustentável?
A Resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) intitulada «Transformar o nosso mundo: Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável» entrou em vigor a 1 de janeiro de 2016 e definiu 17 objetivos principais, desenvolvidos em 169 metas. Estes objetivos são:
- Erradicação da pobreza: acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares
- Fome zero: acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável
- Boa saúde e bem-estar: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades (saúde infantil, saúde materna e HIV/SiDA)
- Educação de qualidade: assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos
- Igualdade de género: alcançar a igualdade de género e empoderar todas as mulheres e meninas
- Água limpa e saneamento: assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos
- Energia acessível e limpa: assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos
- Emprego digno e crescimento económico: promover o crescimento económico inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos
- Indústria, inovação e infra-estruturas: construir infra-estruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação
- Redução das desigualdades: reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles
- Cidades e comunidades sustentáveis: tornar as cidades e os aglomerados populacionais inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis
- Consumo e produção responsáveis: assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis
- Combate às alterações climáticas: tomar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os respetivos impactos
- Vida debaixo de água: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável
- Vida sobre a terra: proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade
- Paz, justiça e instituições fortes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas a todos os níveis
- Parcerias em prol das metas: fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável
O que é uma empresa sustentável?
De acordo com o Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (BCSD), uma associação sem fins lucrativos que reúne mais de 90 empresas portuguesas, a sustentabilidade empresarial consiste na:
Capacidade de uma empresa gerir a sua atividade e de criar valor a longo prazo, ao mesmo tempo que cria benefícios sociais e ambientais para os seus acionistas.
Na prática, uma empresa sustentável é aquela que, na sua atividade, consegue ter um impacto negativo mínimo – ou até positivo – no ambiente, na sociedade e na economia local ou global. No fundo, são empresas que têm valores humanos e ecológicos que vão muito além da concretização de negócios e obtenção de lucro.
Como é uma empresa se torna sustentável?
O primeiro passo consiste em olhar de forma diferente para os processos de produção. A sugestão é da Planetiers, uma empresa portuguesa que criou uma plataforma de produtos sustentáveis e, em Outubro de 2020, promove o “Planetiers World Gathering 2020” um dos maiores eventos do mundo dedicado à sustentabilidade da vida no planeta. Numa crónica publicada no site da TSF, a empresa que se assume como “o Google da sustentabilidade” considera que “na maioria dos casos, os processos das empresas complementam-se e podem ser facilmente otimizados”. No entanto, existem dicas importantes a seguir, tais como:
- Economizar recursos: a racionalização pode ir dos gestos mais pequenos aos mais elaborados. Pequenas ações como “reutilizar papel, evitar imprimir, trocar cartões por contactos virtuais ou fazer reuniões por vídeo chamada” podem ser o início de uma nova atitude. Depois, a uma escala maior, que pode implicar algum investimento existem medidas como “implementação de tecnologia eficiente de baixo consumo, controladores inteligentes de energia ou sistemas de gestão e reaproveitamento de águas, até à consciencialização junto dos colaboradores para a poupança desses mesmos recursos”.
- Evitar descartáveis: de acordo com a Planetiers, “uma empresa com 200 colaboradores gasta em média 60 mil copos descartáveis por ano que acabam no lixo após uma única utilização”. Por isso, afirma: “investir em copos ou garrafas reutilizáveis significa menos desperdício e menos dinheiro a sair da empresa”.
- Promover projetos sustentáveis dentro (e fora) da empresa: neste ponto, é importante que a forma como a empresa comunica seja para dentro – junto dos seus colaboradores – ou para fora. Ou seja, através da promoção de um “ambiente organizacional em prol da ecologia e preservação”, através da partilha de “informação, eventos e formas de envolver todos nesta ideia”.
- Tratar bem dos resíduos: outra das dicas para tornar as empresas cada vez mais sustentáveis passa por pôr em prática exemplos como “reciclar, adotar práticas de economia circular, reutilizar sobras de matéria-prima, ter um compostor doméstico no escritório para usar no jardim”, entre outras.
- Produzir com consciência: as formas e processos de produção também devem ser avaliados. Por exemplo, através do recurso a “fontes de energia limpas e renováveis” e “fornecedores responsáveis”, evitando também “produzir subprodutos que possam pôr em risco a segurança humana e biodiversidade”.
- Brindes bem pensados: muitas empresas têm como hábito oferecer brindes aos clientes, fornecedores ou mesmo aos colaboradores. Em primeiro lugar, segundo a Planetiers, deve questionar-se se são mesmo necessários. Se for o caso, opte por “brindes úteis e reutilizáveis, que tenham uma finalidade bem definida e que transmitam esta mensagem ecológica”.
É preciso ter custos para tornar a empresa mais sustentável?
Depende. Existem pequenos gestos que não implicam quaisquer custos ou, se existirem, são residuais, uma vez que assentam mais na mudança de mentalidades e comportamentos. Por exemplo, como foi referido acima, reutilizar papel, separar o lixo, reciclar, evitar imprimir, utilizar cartões digitais, etc. Outras medidas, que impliquem investimento em equipamento e tecnologia, podem ter um custo inicial, mas, no médio ou longo prazo, acabam por criar valor e ser “uma forma de poupar dinheiro”. Além disso, segundo a Planetiers, tem existido “uma grande valorização de ações em bolsa referentes a empresas com core [base] sustentável, com cada vez mais investidores a procurar estes tipos de organizações”.
Isto significa que uma empresa sustentável pode ser rentável?
Sim, até mais rentável do que outras que não sejam sustentáveis.
E prova disso é que o investimento em ativos que respeitam os critérios de sustentabilidade está a aumentar. Segundo o último relatório da Global Sustainable Investment Alliance, divulgado em Abril de 2019, o número de ativos sustentáveis na Europa, Estados Unidos, Canadá, Japão, Austrália e Nova Zelândia aumentou 34% desde 2016 para 30,7 biliões de dólares – cerca de 25 mil e 700 milhões de euros. Austrália e Nova Zelândia são os países que mais apostam neste tipo de ativos. Já na Europa, segundo o relatório, a tendência está a evoluir a um “ritmo modesto”.
Como saber se um ativo é sustentável?
Os fundos de ações ou obrigações estão identificados como tal. Podem incluir na própria designação expressões como “sustentável”, “responsável” e “verde” ou siglas como SRI (do inglês Socially Responsible Investing, ou seja, Investimento Socialmente Responsável) ou ESG (do inglês Environmental, Social and Governance, ou seja, com critérios ambientais, sociais e de governação). Existem também índices bolsistas que só consideram a negociação de empresas com estas caraterísticas: é o caso do MSCI KLD 400 Social Index e o Dow Jones Sustainability Index. Em Portugal, a CMVM também tem uma área dedicada à sustentabilidade, embora a bolsa de Lisboa tenha muito menor dimensão do que a maioria das praças europeias.
Existem empresas portuguesas sustentáveis?
Sim. E algumas estão até colocadas entre as melhores do mundo.
De acordo com o “The Sustainability Yearbook 2020” , um relatório realizado pela consultora norte-americana S&P Global em parceria com a Robeco SAM, a EDP, Galp, Banco Comercial Português e Jerónimo Martins são as quatro empresas portuguesas que merecem esta distinção. Segundo este relatório, a EDP é a empresa portuguesa que tem a melhor pontuação, chegando mesmo a posicionar-se entre as dez mais sustentáveis numa lista de 4.710 empresas de 61 setores de várias regiões do mundo. Na lista das empresas portuguesas, a Galp é a segunda melhor classificada. Seguem-lhe o Banco Comercial Português e a Jerónimo Martins. A nível mundial, o primeiro lugar é ocupado pela tailandesa Thai Beverage.
Os consumidores procuram produtos mais sustentáveis?
Sim. Além disso, o surto de Covid-19 veio aumentar esta tendência.
Segundo o estudo da Capgemini, “Produtos de Consumo e Retalho: como a sustentabilidade está a mudar fundamentalmente as preferências do consumidor”, 79% dos consumidores tem em conta a sustentabilidade do produto ou empresa no momento de compra, sendo que 67% garante estar mais conscientes da escassez de recursos naturais devido ao coronavírus. Além disso, 53% dos consumidores em geral e 57% entre os 18 e os 24 anos passaram a comprar marcas menos conhecidas por serem mais sustentáveis. Já 64% dos inquiridos afirmou que já fazia esta escolha antes da pandemia. 52% asseguram ainda ter uma ligação emocional com produtos ou organizações sustentáveis e 64% dos inquiridos afirma que comprar produtos sustentáveis deixa-os mais satisfeitos.
Como se aprende sobre sustentabilidade?
A oferta ao nível de formação superior na área da sustentabilidade também tem vindo a aumentar em Portugal. É o caso, por exemplo, do ISAG – Instituto Superior de Administração e Gestão – que disponibiliza uma pós-graduação em Comunicação e Sustentabilidade e a Católica, em Lisboa, que propõe um Executive Master in Sustainable Business & Social Innovation.
Em Portugal e um pouco por todo o mundo ainda é necessário fazer um longo caminho na direção da sustentabilidade e redução do desperdício.
Se ainda está a dar pequenos passos, pode, por exemplo, começar por poupar energia (quem sabe, até, comprar um carro elétrico), poupar água, mudar alguns comportamentos quer em casa, no trabalho ou em ocasiões especiais, reciclar, reutilizar e saber o que deve (e não deve) deitar no lixo, entre muitas outras possibilidades.
Se ainda não começou, comece por si: para o bem de todos e do ambiente.