Autocaravanas: a liberdade de fazer férias sobre rodas
Imagine o que é ter uma casa sobre rodas, deixar para trás as rotinas, horários e obrigações e, simplesmente, partir à descoberta? A liberdade, a proximidade com a natureza, o tempo que chega para tudo, a surpresa de acordar todos os dias diante de uma paisagem diferente… Seja pelo espírito de aventura ou pela necessidade de isolamento devido à pandemia de Covid-19, a verdade é que a procura por autocaravanas, em Portugal, tem aumentado. Segundo dados da Yescapa, uma plataforma de aluguer de autocaravanas entre particulares, em 2020, registou-se um aumento de 50% no número de reservas em comparação com o ano passado e um crescimento de quase 400% nas visitas ao site.
Para quem é caravanista de primeira viagem, podem surgir inúmeras dúvidas: onde vou dormir? Como vou tomar banho? E ir à casa-de-banho? Posso cozinhar ou tenho de comer fora? Onde posso estacionar? É caro? Posso levar as crianças? Como planeio a viagem?
O Contas Connosco dá a conhecer três experiências diferentes – um casal com cinco filhos, um casal sem filhos e dois amigos – e reúne as principais informações para inspirar-se e lançar-se à estrada numa autocaravana durante as férias ou num fim-de-semana.
“Queríamos uma aventura no nosso país”
Mariana Seara Cardoso tem cinco filhos entre os 9 meses e os 6 anos: um bebé e dois pares de gémeos. Antes da pandemia, a ideia inicial era irem de autocaravana ao País Basco acompanhar a participação do marido num Iron Man (prova de triatlo de exigência elevada). Com o surto de Covid-19, a prova foi cancelada e a necessidade de redobrar os cuidados levou a que ficassem em Portugal. Mas não desistiram da ideia de viajar de autocaravana. Destino escolhido: Beira Baixa. “É um destino que não conhecíamos, tem pouca gente e queríamos fazer algo diferente. Queríamos uma aventura no nosso país. A ideia era dormir sempre perto da água. Não queríamos ir para parques de campismo. Se fôssemos para sul ou para a costa vicentina já não era possível porque não se pode dormir em qualquer lado, há imensas restrições”, explica.
Habituada a gerir uma família numerosa de forma descomplicada, a autora do blogue Aos Pares confessa que a viagem não foi muito organizada. O primeiro passo foi procurar uma caravana onde coubesse toda a família: “A única empresa que tem caravanas para sete pessoas é a Campilider e só se pode levantar em Faro ou em Ovar. Optámos por ir buscar a Ovar e deixámos o carro na empresa. Antes de irmos, vimos no mapa o concelho da Beira Baixa e os sítios principais. Depois, identificámos qual era a praia fluvial mais próxima a partir de Ovar. O resto fomos pesquisando ao longo da viagem”.
Quanto a objetos e utensílios necessários, Mariana sugere reduzir a lista ao indispensável: “Uma das dicas que dou é não levar muita coisa. Levei algumas refeições congeladas e as sopas do bebé; pratos e copos de papel caso ficássemos sem água para lavar; aluguei pratos e tachos; levei sacos-cama para os gémeos e aluguei um de casal. Para o bebé dormir, levei uma piscina pequena e coloquei lá dentro o colchão do berço. A caravana tem fogão, frigorífico e imensos armários”.
Nem a casa-de-banho representou um problema – apesar de ser um dos principais entraves apontados em relação às férias numa autocaravana: “Íamos a parques de campismo limpar a casa-de-banho e abastecer água. Acho que não é difícil limpar a casa-de-banho. É retirar uma caixa e despejar. Tem um produto que desfaz tudo, não se vê nada. Para abastecer água é só encher com uma mangueira”.
Para quem pensa que pode ser desafiante ou exigente fazer uma viagem destas com crianças, Mariana Seara Cardoso, mais uma vez, simplifica: “Acho mais fácil estar na autocaravana com os cinco do que em casa. Não há nada para desarrumar. Não temos de andar a correr atrás deles, com horários e obrigações.Eles acordam e vão para a água. É preciso descomplicar e descontrair: se tomarem banho no rio, tomam banho no rio. É para estar na natureza e na terra. Isso é que é giro e eles nunca mais se esquecem. Foi tudo bom. Toda a gente devia fazer”.
Dicas da Mariana:
- Se quiserem dormir perto da água, pesquisem praias fluviais que estejam abertas 24 horas por dia
- Levar (ou alugar) mesa e cadeiras para as refeições
- Não entrar na caravana de sapatos
- Levar tacho, frigideira e sacos-cama
- Evitar objetos de vidro porque os armários podem abrir
- Reduzir os utensílios e roupa ao essencial
- Descomplicar e descontrair
Custos
- Caravana para sete pessoas: 1200€ para 8 dias, 7 noites
- Limpeza no parque de campismo: 2,5€
- Combustível da autocaravana: “gasta pouco”
- Restaurantes na Beira Baixa “são baratíssimos”
“O livrete de todas as autocaravanas deveria dizer ‘liberdade’”
Rui Peres foi à procura de um “turismo mais distante” por causa da pandemia, mas, ao mesmo tempo, encontrou “um grande espírito de partilha” dentro da autocaravana. Quando relata a experiência, liberdade é uma das palavras que mais repete. Habituado a percorrer o mundo – e a escrever sobre ele –o autor de Mal Parado prepara-se, nesta altura, para a segunda viagem de autocaravana deste ano. No início de junho, fez uma surf trip pelo sudoeste alentejano com um amigo. Em agosto, vai percorrer a estrada N2 de Chaves a Faro.
Para Rui Peres, “a escolha do veículo de deslocação é o passo mais importante”. Por isso, optou por pesquisar em “blogues, sites, artigos, relatos de experiências e referências de outros viajantes” até encontrar o que pretendia. No momento de alugar, aconselha “verificar bem a autocaravana uma vez que, normalmente, são antigas e existe a possibilidade de terem equipamento danificado”.
O passo seguinte foi definir o percurso: “Optámos, primeiro, por destinos de praia e sol e, depois, por lugares mais recônditos e de património cultural. Em ambos os casos, o desejo da escolha do lugar é sempre o mesmo: encontrar, o mais possível, lugares de origem; a gastronomia mais típica de cada local; a árvore mais milenar; a arquitetura mais genuína; as pessoas mais autênticas”. Apesar de afirmar que “é importante ter um plano”, Rui acredita que “a imersão na experiência deste tipo de viagem é maior se existirem traçados e rotas abertas e/ou flexíveis”.
Ainda assim é necessária alguma preparação até para fazer face aos desafios como os locais para dormir, a acessibilidade de algumas vias e o abastecimento e escoamento de águas: “Existem algumas restrições nos locais para dormir, por exemplo, não se pode dormir em parques naturais, o que obriga a deslocações extra. Os recursos, principalmente a água, são limitados e nem em todos os locais é possível reabastecer. Há a mesma limitação para o escoamento das chamadas ‘águas sujas’”. Quanto aos caminhos de mais difícil acessibilidade, “por vezes, é necessário fazer o reconhecimento do terreno a passo e, só depois, com a autocaravana”.
O espírito é de aventura, mas a sensação – garante Rui Jorge – é de segurança: “Se chegarmos a um lugar sobre o qual nada sabemos, estamos sempre tranquilos. Estar à disposição da meteorologia e da geologia com uma autocaravana dá-nos um certo ‘caparro’, uma segurança. Essa segurança e, ao mesmo tempo, a novidade das coisas convida-nos ao espírito aberto. Em poucas palavras: o livrete de todas as autocaravanas deveria dizer ‘liberdade'”. Quanto à convivência – assegura em jeito de contador de histórias irónico – também pode ser desafiante: há que “preparar a mente e o corpo para viverem e conviverem períodos de tempo ao longo do dia como se estivessem numa sala de espera de um consultório”. Depois é só ir “com os dentes arreganhados e com o pé direito responsável”: a acelerar – mas pouco – rumo a uma aventura bem medida.
Dicas do Rui:
- Antes de partir para a aventura, ler o site campingcarportugal.com onde encontram informações importantes como a lista de áreas de serviço para reabastecimento de água
- Verificar bem a autocaravana antes de a alugar porque pode ter equipamentos danificados (um exemplo disso são os suportes dos tapa-vidros)
- Levar comida e utensílios como tachos, almofadas, esfregões, panos, detergentes, sacos para o lixo, temperos, fósforos, entre outros
- Entregar a autocaravana no estado em que foi alugada para evitar a cobrança de custos adicionais
- Caso forem detetadas anomalias no pós-aluguer, reportar o problema à empresa com a maior brevidade
- Estimar o número de quilómetros a percorrer uma vez que há alugueres que têm limites
- Ter um plano, mas manter o espírito aberto
Custos:
- Caravana com quatro lugares: 55€ por dia (preço teve 20% de desconto)
- Seguro com cobertura máxima: 15€ por dia
- Caução: 750€ (paga em dinheiro ou cartão e é devolvida, no final, se a autocaravana não tiver danos)
“O dia tem mais tempo”
Filipa Cerqueira aventurou-se com o namorado numas férias de autocaravana há cerca de seis anos. Hoje a vida mudou e o namorado também, mas a experiência é para repetir.
Na altura, não precisaram de recorrer a empresas de aluguer porque o namorado tinha o sonho de comprar uma autocaravana. Assim fez e lá foram duas semanas de férias: “A ideia era descer a Nazaré e fazer a costa vicentina toda. Não queríamos ficar em parques de campismo e, nos primeiros dias, era engraçado pensar onde é que eu vou dormir”, conta.
Apesar de ter um casal amigo que aluga autocaravanas, através da Road Trip Campers, Filipa era novata na experiência. Mesmo assim, “não houve grande planeamento da viagem”. A única preocupação era a segurança: “Uma das preocupações era parquear ao pé de outras autocaravanas. Um dia, decidimos parar ao pé de uma das praias em Vila Nova de Mil Fontes, mas não havia mais carros esentimos alguma insegurança, por isso, decidimos ir para perto dos outros”.
De resto, Filipa acredita que para “uma viagem deste género não é necessário fazer grandes planos. O importante é ter comida porque podemos ter fome e não ter onde parar”. E, nesse aspecto, optaram por “levar tudo”: “Levámos desde azeite, vinagre, enlatados… Quando alugas, já tens lençóis e loiça, mas nós levámos isso tudo. Os armários têm uns locais específicos onde encaixas as coisas para que não caiam enquanto estamos em movimento”.
Quanto à casa-de-banho, Filipa conta que a autocaravana “não tinha duche, mas tinha aquela sanita que é preciso despejar” – algo que não agradava ao casal: “Como não achávamos muita piada, optávamos por ir a casas-de-banho de cafés”. Já para tomar banho, colocavam um depósito de água “em cima da auto-caravana e ao final do dia estava quente”.
Filipa Cerqueira não tem qualquer dúvida que a experiência de passar férias numa autocaravana “tem muito mais vantagens do que desvantagens”: “Parece que o dia tem mais tempo. Não há a preocupação de ir para o hotel ou para uma casa. Ligamo-nos mais à natureza e aos outros e aproveitamos mais as férias. Mas é preciso ter espírito de aventura”.
Dicas da Filipa:
- Se optar por alugar a autocaravana, informe-se sobre o consumo
- Algumas empresas de aluguer de autocaravanas, além da loiça e dos lençóis, alugam também pranchas de surf e jogos, que podem ajudar a passar o tempo
- Hoje em dia, o estacionamento na Costa Vicentina e Algarve pode ser um desafio. Além disso, a Polícia está mais atenta ao estacionamento proibido e multa as autocaravanas.
Custos:
- Atualmente, o aluguer varia entre os 65€ e 75€ por dia
- Se quiserem fazer umas férias mais baratas, tentem controlar os custos através das refeições, levando mais comida
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- Inspire-se
Se ainda não sabe para onde pretende ir ou como deve planear a sua viagem, comece por pesquisar. A maior parte das pessoas começa pelo mais óbvio: utilizar um motor de busca na internet para encontrar o que precisa. Se quiser ir diretamente para um site que disponibiliza informação sobre o tema, experimente o CampingCar Portugal. Depois disso, pode também inspirar-se nos relatos e experiências de outros viajantes como Blog Aos Pares, Um Mundo a 3 Mais 2, Mal Parado, Alma de Viajante, entre outros.
- Procure a autocaravana ideal para si
Dependendo do número de pessoas, da viagem ou até do estilo do veículo que pretende, pode encontrar muitas opções. Sugerimos alguns sites onde pode alugar autocaravanas:
- Campilider
- Indie Campers
- Road Trip Campers
- Siesta Campers
- Yescapa (aluguer entre particulares)
Antes de fazer o aluguer, repare onde terá de levantar a autocaravana e avalie se a localização é conveniente para a viagem que pretende fazer. Além disso, tome atenção ao estado do veículo e, se necessário, tire fotografias para depois, no final, quando for entregar, não ter surpresas.
- Faça contas
Para além do custo de aluguer da autocaravana, note que também vai precisar de um seguro e, provavelmente, de pagar uma caução (em cartão ou dinheiro), que lhe será devolvida, no final, se não houver danos no veículo. Informe-se sobre o consumo de combustível e procure calcular as portagens no trajeto que pretende fazer durante o fim-de-semana ou férias. Lembre-se que terá de ir levantar a autocaravana à empresa de aluguer e isso também implica custos de deslocação. Confirme também se, na empresa de aluguer ou perto, existe estacionamento para deixar o seu carro. Além de tudo isto, veja se precisa de comprar – ou alugar – outros bens indispensáveis para a viagem como sacos-cama, lençóis, mesa e cadeiras, etc.
- Arrume as malas (com pouca coisa)
Resuma as suas necessidades ao essencial. Se não quiser gastar dinheiro a alugar, leve loiça, lençóis e toalhas de casa. Quanto à roupa de vestir, se vai de férias de verão, provavelmente, precisará de pouco mais do que fato-de-banho, toalha, chinelos, duas ou três peças de roupa leve e um casaco. Limite os brinquedos das crianças e deixe em casa computadores portáteis e tablets. Afinal, o objetivo é “desligar a ficha” e conectar-se com a natureza.
- Leve mantimentos
Mesmo que queira experimentar a gastronomia local, é importante levar alguma comida até porque pode acontecer, numa viagem mais longa, não ter onde parar ou ter fome a meio da noite. Pode optar por refeições congeladas, enlatados e alguns frescos (poucos) que caibam no frigorífico. O resto compra pelo caminho.
- Dê uma volta nas redondezas
Antes de se lançar à estrada, é importante que conheça a autocaravana: veja quais as comodidades existentes, onde ficam os depósitos, como se utilizam… Em suma, coloque todas as dúvidas que lhe surgirem. Há autocaravanas cada vez mais modernas – com água, gás e eletricidade – mas também existem outras mais antigas. Tenha o cuidado de verificar se não tem equipamento danificado ou a funcionar mal.
Se nunca conduziu um veículo desta dimensão, teste-o antes de prosseguir viagem. De preferência, num local seguro, que lhe seja familiar ou, em alternativa, próximo da empresa de aluguer, caso precise de ajuda.
- Identifique as paragens necessárias
Por mais modernas que sejam as autocaravanas, os recursos – como água, gás ou eletricidade – ainda são limitados. Como tal, vai precisar de parar num parque de campismo ou em áreas de serviço para abastecer o depósito de água potável e descarregar o reservatório das chamadas “águas sujas”. Por isso, convém identificar os locais onde poderá fazê-lo. Segundo o blogue Alma de Viajante, “há organismos públicos que construíram locais de apoio para caravanistas e há empresas como o Intermarché, que dispõem de estações gratuitas construídas para o efeito em muitas das suas lojas”. Além disso, há ainda “algumas estações de serviço nas autoestradas, que permitem despejar os resíduos sanitários gratuitamente”.
Tenha atenção que é proibido passar a noite em áreas protegidas como parques naturais, reservas, monumentos e paisagens protegidas. Além disso, foi recentemente interditada a permanência de autocaravanas ou semelhantes nos parques de estacionamento de praias (de mar ou rio) e piscinas ao ar livre. E, segundo os relatos dos viajantes ao Contas Connosco, a Polícia está atenta e a passar multas. Por isso, não arrisque e veja onde pode estacionar dentro da lei. Pode pesquisar no Info4Camper, por exemplo.
Se, além de reabastecer água e despejar resíduos, quiser optar por passar algumas noites num parque de campismo para descansar e tomar um bom banho,pode pesquisar no CamperContact .
Além das pesquisas na internet, talvez seja prudente fazer alguns contactos por telefone, uma vez que, por causa da pandemia, alguns locais podem estar fechados ou não ter a informação disponível online atualizada.
- Trace um plano (e fuja dele sempre que possível)
Por mais que seja apetecível – para alguns – ir à aventura, convém saber o mínimo essencial. Informe-se sobre a localidade para onde pretende ir, qual o percurso que vai fazer – estradas principais, secundárias, portagens – os pontos de interesse e, claro, os locais onde poderá parar (seja para dormir ou abastecer). Mantenha o espírito aberto e, se tiver oportunidade e vontade, improvise um pouco e fuja ao plano.
Hoje em dia, a maior parte das pessoas tem telemóvel com internet e GPS, mas lembre-se que, em alguns pontos do país, a rede pode falhar ou nem sequer existir. Por isso, leve mapas de papel – à antiga mesmo.
Tendo em conta o contexto de pandemia, lembre-se que podem existir restrições à circulação em algumas localidades, sobretudo se tiver de passar a fronteira para Espanha.
- Prepara-se para imprevistos
Quase todas as viagens incluem imprevistos e – confesse – são esses episódios que tornam tudo ainda mais inesquecível. Seja como for, lembre-se que, por mais que faça planos, há uma série de variáveis que não podemos controlar. Pode ter um furo, um problema mecânico, um imprevisto com a Polícia… enfim. Tenha à mão alguns contactos de emergência e lembre-se que o mais importante é manter a calma.
- Divirta-se
Esqueça os horários, as rotinas e as obrigações. Deixe a televisão e os aparelhos eletrónicos em casa, guarde o telemóvel e usufrua da liberdade dos dias: permita-se ser e estar no momento, com a natureza, na companhia dos seus. Boas férias!